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Direito do Trabalho

Atualizado 10/11/2023

A controversa recepção da não cumulatividade dos adicionais de insalubridade e periculosidade pela CRFB.

Carlos Stoever

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A controversa recepção da não cumulatividade dos adicionais de insalubridade e periculosidade pela CRFB.

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) estabeleceu que a saúde é um direito social, de acesso universal e igualitário, sendo um dever do Estado a sua garantia (arts. 6º e 196).

CF/88 Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (…) Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O art. 7º da CF/88 garante a proteção da saúde do trabalhador, além de um meio ambiente ecologicamente equilibrado essencial a uma qualidade de vida sadia (art. 225).

CF/88 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…) XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; XXIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;

(…)

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

Portanto, a saúde é um direito indisponível do próprio cidadão, que independe da sua vontade (daí se diz que esse direito tem caráter de ordem pública) e, razão pela qual o Estado estende o seu dever de mantê-la íntegra mediante leis e normas para que a saúde mental e física do trabalhador seja preservada.

Assim, não seria diferente com relação aos trabalhadores.

Dessa forma, cabe ao empregador proporcionar ao trabalhador um ambiente de trabalho saudável e higiênico, e quando não é possível excluir, evitar ou neutralizar condições nocivas à saúde, o empregador deve pagar um adicional salarial como forma de “compensar” o desgaste ou risco que ele submete o empregado em virtude das atividades da empresa.

Logo, o adicional de insalubridade e de periculosidade tem como objetivo a compensação do trabalhador por se expor a agentes nocivos a saúde.

Mas de acordo com o §2º do art. 193 da CLT, quando o trabalhador trabalha ao mesmo tempo em ambiente insalubre e periculoso, cabe a ele a escolha do adicional que mais lhe favorecer.

Por exemplo: No que tange a insalubridade, a perícia constatou que o grau é médio (20%). Mas no ambiente também contém agentes periculosos (30%) em que o trabalhador fica permanentemente exposto.

Assim, deverá o trabalhador optar por um dos adicionais, sendo proibida a sua cumulação.

CLT Art. 193 (…) § 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido.

Contudo, o tema é muito discutido pela Doutrina e pelos Tribunais, ainda que haja legislação em sentido contrário.

Analisemos: Se cada adicional tem a função de indenizar a nocividade de agentes diferentes ao trabalhador, é “injusto” por assim dizer, que o trabalhador receba tão somente um tipo de agente que lhe causa dano.

Neste sentido, Vólia Bonfim Cassar (in Direito do Trabalho, 2017):

“A norma proibitiva do acúmulo também afronta a Constituição, que considera saúde como um direito social (art. 6º) e fere princípios como o da dignidade da pessoa humana e o da proteção ao trabalhador. Além disso, contraria os valores que exsurgem das Convenções Internacionais 148 e 155 da OIT, e, por esse motivo, a regra é inválida, letra morta, norma superada pela interpretação constitucional. Aliás, o TST já tem decisões defendendo essa tese, que ainda é minoritária, pois a jurisprudência e a doutrina dominante são no sentido de respeitar o §2º do art. 193 da CLT.”

Este também é o entendimento de Gustavo Filipe Barbosa Garcia, in Curso de Direito do Trabalho (2017):

“Por fim, como o art. 193, § 2.º, da CLT assegura o direito do empregado de optar entre o adicional de periculosidade e o adicional de insalubridade, tende a prevalecer o entendimento de que ele não faz jus ao recebimento de ambos os adicionais ao mesmo tempo, posicionamento este que, no entanto, merece fundada crítica, pois, se o empregado está exposto tanto ao agente insalubre como também à periculosidade, nada mais justo e coerente do que receber ambos os adicionais (art. 7.º, inciso XXIII, da CF/1988), uma vez que os fatos geradores são distintos e autônomos. Além disso, a restrição a apenas um dos adicionais acaba desestimulando que a insalubridade e a periculosidade sejam eliminadas e neutralizadas, o que estaria em desacordo com o art. 7.º, inciso XXII, da Constituição Federal de 1988.”

Embora haja decisões no TST neste sentido, há uma grande contradição, pois no mesmo ano em que decidiu pelo pagamento de dois adicionais em abril de 2016 na SDI-I do TST (RR 7092-95.2011.5.12.0030), em outubro daquele mesmo ano a decisão foi contrária no Recurso de Revista de nº 1072-72.2011.5.02.0384.

Certo é que a Carta Magna prevalece sobre todas as normas infraconstitucionais, o que causa estranheza de o art. 193, §2º da CLT continue sendo recepcionado pela Constituição Federal.

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Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Função Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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