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Direito do Trabalho

Atualizado 10/11/2023

A insegurança jurídica do contrato de trabalho intermitente

Carlos Stoever

3 min. de leitura

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A insegurança jurídica do contrato de trabalho intermitente

Vários noticiários informam o aumento dos contratos na modalidade de trabalho intermitente, mesmo ele sendo um tanto quanto inseguro juridicamente.

Essa insegurança jurídica ocorre não só pela dificuldade de sua conceituação,  pela queda da MP 808/2017 – que lhe dava ares de constitucionalidade, mas, sobretudo, pela ausência de normas claras e congruentes com as disposições celetistas e constitucionais.

Ocorre que no Brasil é preferível “remediar a prevenir”, e como passaremos a analisar, o contrato de trabalho intermitente – assim como a reforma trabalhista, foi feita sem muita reflexão.

No que tange a conceituação de trabalho intermitente, dispõe o artigo 443, §3º da CLT:

Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) (…) §3º – Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria. (grifou-se)

A primeira vista, se observa que se o trabalho não é contínuo, logo, é eventual, o que desconfigura a um dos requisitos do contrato de trabalho que é a não eventualidade, conforme consta no artigo 3º da CLT:

Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. (grifou-se)

Há ainda mais dispositivos que geram discussões acerca do trabalho intermitente, vejamos as disposições do artigo 452-A que dispõe mais especificamente sobre o contrato intermitente.

Analisemos:

Art. 452-A – O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

O caput do artigo, de fronte, colide com cláusula pétrea da Constituição Federal, que dispõe que no art. 7º, incisos IV e VII o direito do trabalhador a percepção de um salário mínimo.

§1º – O empregador convocará, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

§2º – Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

§3º – A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

§4º – Aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% (cinquenta por cento) da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

Se um trabalhador foi contratado para trabalhar um trimestre, e por fatores externos, faltou metade do primeiro turno ele deverá pagar pelas horas faltantes, pelo dia faltante ou pelo trimestre inteiro?

§ 5º – O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) § 6º – Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) I – remuneração; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) II – férias proporcionais com acréscimo de um terço; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) III – décimo terceiro salário proporcional; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) IV – repouso semanal remunerado; e (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) V – adicionais legais.(Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

Voltamos mais uma vez a questão do trabalhador que foi contratado para trabalhador um trimestre. Ele receberá sua remuneração apenas no 3º mês e afrontará o artigo 459 da CLT que limita o pagamento do salário, em qualquer modalidade, em período não superior há 1 mês?

§ 7º – O recibo de pagamento deverá conter a discriminação dos valores pagos relativos a cada uma das parcelas referidas no § 6o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) § 8º – O empregador efetuará o recolhimento da contribuição previdenciária e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma da lei, com base nos valores pagos no período mensal e fornecerá ao empregado comprovante do cumprimento dessas obrigações. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) § 9º – A cada doze meses, o empregado adquire direito a usufruir, nos doze meses subsequentes, um mês de férias, período no qual não poderá ser convocado para prestar serviços pelo mesmo empregador. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

No que tange às férias (§9º), como se realiza a contagem do período aquisitivo?

A omissão de clareza nessas perguntas causa insegurança jurídica ao empregador, bem como, causam mais prejuízos para os trabalhadores e incentivos para a contratação de trabalhos informais – o qual seria o foco do trabalho intermitente.

No Reino Unido existe um contrato de trabalho muito semelhante, chamado de “trabalho zero hora”, mas é aplicado à pessoas que gostariam de complementar a renda (em sua maioria pessoas menores de 25 anos e idosos aposentados), que não tem o trabalho intermitente como única fonte de renda.

Em Portugal o trabalho intermitente é aplicado em empresas que exerçam atividades com descontinuidade ou intensidade variável.

De acordo com o site Conjur “Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) de 2018 mostram que trabalho intermitente não foi muito adotado no mercado de trabalho. Das 47,3 mil vagas abertas em julho, apenas 3,4 mil eram para trabalho intermitente”.

Enquanto isso, tramitam no Supremo Tribunal Federal quatro ações diretas de inconstitucionalidade sobre o contrato de trabalho intermitente, que são as ADIs 5.806, 5.826, 5.829 e ADI 5.950.

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Função Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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