Atualizado 21/06/2022
Quais princípios da LGPD são aplicáveis ao Setor Público?
Carlos Stoever
3 min. de leitura
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A Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018), entrou em vigor em setembro de 2020.
Em seguida, em novembro do mesmo ano, foi instituída a Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD.
Obviamente, o Brasil deu passos importantes para o estabelecimento de um ambiente de maior segurança jurídica quanto às atividades de tratamento de dados pessoais.
Inspirada no regime jurídico vigente na Europa, a legislação brasileira introduziu sistemática de proteção de dados pessoais baseada em um conceito amplo de dado pessoal, definido como aquele dado relacionado a uma pessoa natural identificada ou identificável; no estabelecimento de uma pluralidade de bases legais como condição para o exercício de atividades de tratamento; e na fixação de um conjunto de princípios a orientar as atividades de tratamento de dados pessoais, tendo como norte o princípio da boa-fé.
Até o momento, os casos apreciados pelo Poder judiciário têm sido solucionados com base no exame dos princípios jurídicos relacionados à proteção de dados pessoais, estando expressos na LGPD ou sejam eles decorrentes, explícita ou implicitamente, da Constituição Federal[2].
A LGPD deixa claro de que os princípios nela contidos se aplicam integralmente ao Estado (Cf. Art. 4º, § 1º, c/c art. 26 da LGPD).
Quais são os princípios contidos na LGDP e como eles se relacionam com o setor público?
Princípio geral da boa-fé.
O principal é o da boa-fé, o qual deve ser observado incondicionalmente – mesmo em caso de exceção legal (art. 4ª, 1§). Pode-se dizer que são filtros de proporcionalidade no tratamento de dados pessoais. Sendo de observância cumulativa, não eletiva. É também fator indicativo do nível de proteção do país estrangeiro (art. 34, inciso III).
Os princípios da finalidade, da adequação e da necessidade.
Estes são de longe, a maneira mais intensa de restrição das atividades de tratamento de dados pessoais.
Isso porque os dados pessoais, representam a expressão direta da personalidade humana, permanecem vinculado ao seu titular, daí decorre a necessidade de se limitar a possibilidade de qualquer utilização secundarista e impedir que sejam considerados como suscetíveis de comercialização indiscriminada[3].
Vejamos os conceitos do Art. 6º, incisos I, II e III:
Finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades;
Adequação: compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao titular, de acordo com o contexto do tratamento;
Necessidade: limitação do tratamento ao mínimo necessário para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados.
Os princípios do livre acesso, da qualidade e da transparência.
Tais princípios além de estarem vinculados aos demais direitos previstos na LGDP, possuem ligação direta com outros tantos direitos e garantias previstos em nossa Constituição a qual atribui aos cidadãos em face do setor público.
Como por exemplo: o direito ao habeas data (art. 5º, LXXII, CRFB), o direito de receber informações de órgãos públicos (art. 5º, XXXII, CRFB) e o princípio da publicidade que incidente sobre a administração pública (art. 37, CRFB).
Vejamos resumidamente os conceitos do Art. 6º, incisos IV, V e VI:
Livre acesso: consulta facilitada e gratuita sobre a forma e a duração do tratamento.
Qualidade dos dados: exatidão, clareza, relevância e atualização dos dados.
Transparência: informações claras, precisas e facilmente acessíveis.
Na prática, as provações da LGPD para concretizar os princípios do livre acesso, da qualidade e da transparência no setor público, são bem similares às provações enfrentadas no passado quando da concretização da Lei de Acesso a Informação (Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011), as quais estão ligadas em sua maioria a uma cultura superação do sigilo[4].
Os princípios da segurança, da prevenção e responsabilização.
Vale dizer que estes são os que impõem obrigações aos agentes de tratamento de dados e se conectam com diversos outros dispositivos da LGPD, os quais dispõem sobre segurança e as boas práticas quanto ao tratamento de dados pessoais.
Vejamos resumidamente os conceitos do Art. 6º, incisos VII, VIII e X:
Segurança: proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão;
Prevenção: prevenir a ocorrência de danos em virtude do tratamento de dados pessoais;
Responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das normas de proteção de dados pessoais e, inclusive, da eficácia dessas medidas.
O princípio da não responsabilização.
Vejamos resumidamente o seu conceito ao Art. 6º, inciso IX:
Não discriminação: vedação de fins discriminatórios ilícitos ou abusivos.
Vale destacar que o princípio da não discriminação previsto na LGPD, também se conecta diretamente às normas incidentes sobre o poder público, isso porque homenageia o princípio constitucional da igualdade, disposto ao art. 5º, inciso XLI, que reza que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.
Ao fim, nas palavras dos professores Denise Francoski e Fernando Tasso[i], observa-se que os princípios da LGPD, possuem firmes âncoras constitucionais, as quais podem ajudar na interpretação desta nova lei. Por óbvio, que os princípios da LGPD não eliminam outros direitos e princípios existentes na legislação brasileira, devendo haver uma coesão entre eles. Especialmente, sobre sua incidência ao poder público, há uma delicada dança entre eles, ora com pontos de convergência e ora com pontos de conflito, ao mesmo tempo complementam-se e se restringem de forma mutua.
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