PROCESSOnº 0020306-14.2015.5.04.0103 (RO)
RECORRENTE: RAFAEL SANTOS DA ROSA
RECORRIDO: MICROLINS EDUCAÇÃO E PROFISSÃO
RELATOR: KARINA SARAIVA CUNHA
INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PERDA DE CHANCE. É insuficiente à pretensão ao ressarcimento dedano por perda de uma chance a mera alegação de ter havido descumprimento de obrigação de contratar, sem prova de que o autorrecebeu proposta de emprego e de que a reclamada desistiu da contratação sem qualquer justificativa.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
ACORDAM os Magistrados integrantes da 5ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: À unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário do reclamante.
Intime-se.
Porto Alegre, 10 de março de 2016 (quinta-feira).
O reclamante interpõe recurso ordinário buscando a reforma da sentença no tocante aos pedidos de indenização pordanos materiais e indenização pela perda de uma chance.
É o relatório.
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE
DANO MATERIAL. PERDA DE UMA CHANCE.
Inconforma-se o reclamante com o indeferimento dos pedidos de indenizaçãopor "dano material causado, no valor de R$4.700,00; dano material no valor de R$5.000,00" (item 5, Id 0c2f0c6 – Pág. 2). Alegaque se candidatou a promotor de vendas da reclamada. Afirma que remeteu currículo e recebeu resposta para comparecer na sededa empresa, no dia 19 de maio de 2015, munido dos documentos (RG, CPF e comprovante de residência, mais duas fotos 3×4). Refereque compareceu à empresa, realizou o curso de promotor de vendas e recebeu certificado, sendo contratado no dia 28/05/2015.Aduz que no dia em que foi contratado pela ré pediu demissão do emprego na Prestlimp – Prestadora de Serviços de Limpeza ePortaria, onde trabalhava desde 16/01/2015, ganhando R$940,00, por mês. Sustenta que, no dia 01/06/2015, foi comunicado quenão estava mais contratado, razão pela qual ingressou com a presente reclamação para haver indenização pelo dano materialsofrido. Afirma que restou provada nos autos a oferta de proposta de emprego. Ressalta que a atividade principal da reclamadaé promover cursos, razão pela qual necessitava de promotores de venda para expandir o seu espectro de clientes. Aduz que odepoimento da testemunha Taís comprova que o autor lhe ofereceu curso na reclamada. Salienta que é normal a testemunha nãolembrar a data em que isso ocorreu, tendo em vista que se trata de fato sem maior importância para ela. Aduz que a testemunha"faz referência à promoção da reclamada realizada no circo". Alega ser razoável sua tese no sentido de que fora preparadopara a função, mas não fora contratado, embora prometido. Assevera que a defesa da reclamada não tem muita lógica (Chamaro reclamante para fazer curso, porque já tinha feito um curso, mas não informa qual, nem quando). Entende que em seu favormilita o fato de ter, no dia 28/05/2015 pedido demissão do emprego. Defende que incide responsabilidade pré-contratual dareclamada, cuja conduta lhe causou danos materiais que devem ser indenizados. Argumenta que a proposta vincula o proponente,desde que séria e, ainda, que não se pode descuidar da seriedade do convite, porquanto gerou pedido de demissão do reclamante.
O juízo de origem analisou as provas produzidas nos autos e concluique:
A prova oral produzida não confirma a tese da inicial de que o reclamantetenha, de fato, recebido uma proposta concreta de emprego, muito menos de que tenha sido contratado.
Ao contrário.
A documentação juntadapor ele próprio revela que recebeu uma mensagem eletrônica convocando para comparecer na empresa. E seu exame em confrontocom os documentos apresentados pela defesa e com as declarações da segunda testemunha (coordenadora pedagógica) permite concluirque foi para a realização de um curso de promotor de vendas – realidade corroborada, também, pelo certificado por ele anexado.
Cabe salientar que elepróprio confirma que sequer chegou a fazer exame admissional ou preencher ficha para contratação.
Ausente, portanto, naconjuntura narrada, prova de chance concreta de contratação ou mesmo de efetiva proposta de emprego.
Saliento, para evitardúvidas, que as declarações da primeira testemunha são genéricas e pouco conclusivas, mormente porquanto ela esteve no localuma única vez e sequer soube precisar a época exata em que isso aconteceu.
Portanto, de pronto, afastoa tese de ato ilícito ou de existência de dano com base na alegada teoria da perda de uma chance.
Em momento algum foi criada,para o autor, por ato da reclamada, expectativa efetiva de contratação.
Outrossim, a possibilidadede escolha das contratações de empregados está inserida no poder discriminatório do empregador.
Não tendo havido provada quebra do princípio da boa-fé objetivo, entendo impossível ser acolhido o pedido de pagamento de indenização.
Analiso.
A reclamada em contestação nega ter contratado o reclamante. Asseveraque ele é cliente da empresa desde 2012, tendo realizado diversos cursos. Sustenta que o setor de marketing utilizou o cadastroexistente no banco de dados da empresa, formado por ex-alunos, enviando para alguns, entre eles o reclamante, convocando paraque viesse ao estabelecimento no qual foi ofertado um curso de consultor de vendas, sem custo, com o objetivo de divulgara empresa, tendo sido firmado o contrato de prestação de serviços em 19.05.2015. Menciona que o curso foi ministrado de 19a 22 de maio do ano corrente (consoante retificado na audiência – ID 01188d8), sendo fornecido certificado ao autor no final.Assegura que não houve oferta de emprego e que o demandante não comprova o vínculo anterior com a empresa citada na inicial.Aduz não haver prova os requisitos necessários para a configuração da responsabilidade. Impugna o valor pretendido, sob aalegação de que foge do bom censo e configura litigância de má-fé. Insiste que o autor não foi contratado e que tampouco foidada qualquer esperança quanto à futura contratação. Contesta o pleito vinculado à teoria de perda de uma chance. Sustentaque o autor pediu demissão por sua conta e risco e que para se reconhecer a efetiva perda de uma chance é necessária a certezada probabilidade, o que incorre no caso em análise. Por fim, assevera que não h ouve trabalho nem vínculo com a reclamada,salvo a oferta de curso gratuita de 19 a 22 de maio de 2015. (Id 34f864c).
A controvérsia diz respeito à existência ou não de dano indenizáveldecorrente da quebra da expectativa de contratação pelo reclamante para emprego na empresa ré.
Segundo se depreende dos termos da inicial, o autor teria sido contratado na função de promotor de vendas em 28/05/2015 (quinta-feira) a 01/06/2015 (segunda-feira). a tese do reclamante,a reclamada teria desistido imotivadamente da proposta de emprego.
A responsabilidade pré-contratual não é exclusiva do direito civil,sendo aplicável às relações de emprego. Ressalto que a chamada teoria da perda de uma chance, de origem francesa, prevêa indenização do lesado pela perda de uma oportunidade, cujo aproveitamento poderia significar a percepção de um ganho. Épreciso, entretanto, que haja uma certeza, não do prejuízo (pois se estaria, nesse caso, diante de um dano emergente ou deum lucro cessante), mas da perda da oportunidade de se auferir essa vantagem, de sua possibilidade. É necessário, pois, quea perda da chance esteja demonstrada com contornos objetivamente definidos, não se confundindo com uma simples esperança subjetiva.Em suma, a proposta deve ser séria e objetiva, sob pena de engendrar falsas expectativas. O dever de indenizar depende dapresenta da presença do ato ilícito, cumulada com os demais requisitos.
Negada a existência da promessa ou proposta de emprego, o ônus daprova recai sobre o demandante à luz dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC.
Sendo assim, cumpria ao autor comprovar que ocorreu a perda de umachance real de contratação. Com efeito cumpre o autor comprovar o fato constitutivo do direito, a conduta omissiva ou comissiva,violação de um dever jurídico, dano material, nexo causal entre a ação ou omissão e culposa e o prejuízo experimentado.
Cumpre ao reclamante demonstrar que recebeu proposta de empregoe que a reclamada desistiu de forma imotivada de sua contratação já prevista pelas partes poucos dias após a contratação.
A documentação anexada aos autos eletrônicos pela reclamada demonstraque seu objeto social é o "treinamento em desenvolvimento profissional e gerencial" (Id bdf6d97).
O exame da CTPS confirma que o reclamante foi contratado pela PRESTLIMPem janeiro de 2015 (dac5502).
A ré anexa, ainda, documentos evidenciando que, de fato, o reclamanteera seu cliente, tendo contratado os serviços da empresa em mais de uma oportunidade (Ids 565ef70, 6176194 e a041f97, entreoutros) e, inclusive, trancado sua matrícula em fevereiro de 2013 (ID 859de8a).
O último curso realizado pelo autor (contrato de prestação de serviçofirmado em 20/05/2015) era de promotor de vendas (Id c18275a).
A ata de audiência consigna o depoimento do autor, da preposta ede duas testemunhas, "verbis":
Depoimento pessoal do(a) autor(es):
"que tinha a CTPS assinada como auxiliar delimpeza pela empresa Prestlimp; que recebeu uma mensagem eletrônica da reclamado(a) oferecendo um curso e a possibilidadede emprego com salário melhor; que ficou sabendo do valor do salário quando compareceu na reclamado(a); que fez o curso edepois participou de um estágio; que cada um durou uma semana; que segundo o sr. Reginaldo, se o reclamantepassasse de ambos, seria contratado pela CLT; que somente depois de ter certeza de que seria contratado é que rescindiu ocontrato com a Prestlimp; que não chegou a fazer exame admissional na reclamado(a); que não chegou a preencher cadastro enem ficha de registro; que até aquele momento, ninguém tinha preenchido cadastro, nem ficha de registro; que o estágio terminounuma sexta-feira; que o estágio foi trabalhado e só recebeu vale-transporte; que se afastou da faculdade; que avisou a Prestlimpdesde o dia 19 de maio que estava fazendo um curso e não voltou mais a trabalhar; que depois do último dia do estágio trabalhounum sábado de manhã; que na segunda-feira, o Sr. Barcelos, que ministrou o curso, informou que não assinaria a CTPS do depoentee que ele poderia continuar trabalhando como "free lancer", por comissões, fora da empresa; que o curso era das 8h às 12he das 13h30min até às 17h30min; que na Prestlimp trabalhava durante o dia; que foi aprovado no curso e no estágio; que dasvinte pessoas ficaram seis e entre elas estava o depoente." Nada mais.
Depoimentopessoal do(a) réu(ré): "que não foi o depoente que enviou o e-mail juntado com a inicial; que sabe que esse e-mailfoi enviado para o reclamante e mais umas 40 ou 50 pessoas com intuito de captar ex-alunos e novos alunos; que foram usadasvárias formas de publicidade pela MICROLINS; que o reclamante já tinha sido aluno da escola; que tinha feito um curso anterior;que o curso que o reclamante fez em 2015 foi gratuito e durou cerca de uma semana; que o professor Barcelos ficou mais doisdias na cidade e ministrou treinamento para alguns dos alunos que participaram do curso, entre os quais o reclamante; queo trabalho era destinado ao mercado de trabalho; que esse trabalho do Professor Barcelos também foi gratuito; que o interesseda MICROLINS neste trabalho era captar alunos para fazerem cursos pagos; que foi treinado atendimento ao cliente e marketingpessoal, bem como dinâmica de grupo; que o reclamante não concluiu a segunda parte do curso porque não compareceu; que a MICROLINSjá tinha uma equipe comercial que fazia as vendas; que o curso não foi ministrado para preparar vendedores; que a gratuidadese justifica porque queriam demonstrar o seu trabalho e captar alunos para cursos pagos; que desse grupo foi contratado umfuncionário novo de nome Adriano, que já era funcionário da MICROLINS de Caxias do Sul; que dos outros cursos gratuitos ninguémfoi contratado; que os cursos gratuitos são rotina na escola; que às vezes pegam e encaminham currículos e encaminham paraparceiros; que nesse curso do qual o reclamante participou não chegaram a pegar currículos; que o reclamante fez a primeiraparte do curso em sala de aula e recebeu a certificação; que ele não quis participar da dinâmica de grupo; que o reclamantesimplesmente não compareceu e o depoente não sabe porque; que essa dinâmica durou quatro dias e o reclamante participou dedois, apenas."
Primeira testemunha doautor(es): TAIS MORALES FONSECA, identidade nº 6106345439, solteiro(a), nascido em 18/11/1995, residentee domiciliado(a) na RUA ALBERTO PIMENTEL, 235 A AREAL. Advertida e compromissada. Depoimento: "que nuncatrabalhou para a reclamado(a) nem fez cursos da MICROLINS; que esteve no circo Tihani e ganhou um bilhete para concorrer aum curso na Microlins; que recebeu um telefonema da Microlins de um homem chamado Rafael, que não sabia quem era; que esteRafael estava no circo e pegou o telefone da depoente; que foi lá na Microlins e acabou não fazendo o curso porque não tinhacondições financeiras; que o telefonema era pra vender o curso; que não lembra qual o número da ligação recebida; que nãosabe quanto custava o curso; que o circo foi num sábado; que não sabe se o Rafael que lhe telefonou era o reclamante; quenão sabe se o reclamante fez o curso; que foi atendida na Microlins pelo reclamante; que não sabe em que sala ele estava;que isso foi em abril ou maio deste ano; que não lembra o mês que foi no circo; que o reclamante na Microlins ofereceu umcurso de Inglês para a depoente; que não sabe quem ministraria o curso." .
Pela ordem registro queo reclamante informou que não participou do evento da reclamado(a) no sábado e domingo do circo Tihani.
Primeiratestemunha do reclamado: VANESSA SIQUEIRA PIRES, (…): "que trabalha desde abril de 2014 para areclamado(a) na função de coordenadora pedagógica; que costumam ministrar cursos gratuitos, mas nunca com promessa de empregopara os que deles participam; que se trata de uma forma de prospectar ex-alunos; que a proposta é chamada Microlins Talentose está divulgada na internet; que há também cursos pagos; que o reclamante não fez estágio na empresa; que não oferecem estágiosna reclamado(a); que acha que o reclamante não atendeu clientes porque isso é feito pela equipe comercial; que ele pode terolhado como o atendimento acontece; que o reclamante não teve proposta de emprego na reclamado(a); que os cursos pagos sãomais de 40 opções, inclusive de inglês; que o reclamante já fez curso pago e foi chamado para participar desse curso gratuito,que é um benefício; que o curso feito pelo reclamante gratuito foi para agente de vendas e marketing pessoal; que o cursogratuito é inteiramente gratuito; que fizeram uma promoção no circo Tihani para curso de Inglês; que acredita que as pessoasque trabalham fazendo vendas dos cursos recebem o piso do comércio
."
É incontroverso nos autos que o reclamante realizou um curso depromotor de vendas na reclamada, de 19 a 22 de maio de 2015, bem como que recebeu o correspondente certificado (Id c18275a),havendo divergência quanto à proposta de emprego por parte da ré da posterior desistência da contratação.
Inicialmente, registro que não há prova nos autos de que o autortenha efetivamente pedido demissão do emprego da sua ex-empregadora no dia em que a reclamada lhe prometeu o emprego, ou seja,no dia 28/05/2015, o que, por si só, favorece a a tese da reclamada.
A reclamada se dedica à realização de diversos cursos e treinamentos("treinamento em desenvolvimento profissional e gerencial"), tendo o reclamante realizado vários cursos oferecidospela ré. Assim, o fato de o autor realizar e receber o certificado do curso de promotor de vendas (Ids c18275 e 42fd14b),realizado de 19 a 22 de maio de 2015, não significa que houve proposta de emprego por parte da ré. Como bem observado na sentença,o próprio reclamante confirma em seu depoimento que não chegou a fazer exame admissional ou preencher ficha para contratação.Com efeito, além de não comprovada, causa estranheza a decisão do reclamante de pedir demissão devido à uma mera promessa(verbal) de emprego da reclamada.
A testemunha apresentada pela reclamada, apenas confirma a informaçãofornecida pela testemunha apresentada pelo autor de que a empresa fez um promoção no circo Tihani, o que apenas reforça aconclusão de que o depoimento da testemunha convidada pela ré é válido na parte em que informa que a reclamada não ofereceestágio.
Afora isso, a realização de estágio, referido no depoimento do autor,não consta da causa de pedir na inicial. Observo que a inicial não refere ter o autor ofertado ou vendido qualquer curso oferecidopela reclamada durante o alegado período de duração do contrato de trabalho (28/05/15 a 01/06/2015).
O depoimento de Vanessa, testemunha ouvida a convite do autor, éfrágil, pois ela desconhece fatos relevantes, além de nada esclarecer sobre a proposta de emprego e a desistência da contrataçãodo autor. Ademais, o oferecimento do curso de inglês se trata de situação isolada e não bem esclarecida pela testemunha, insuficientepara que possa acolher a versão da petição inicial. Os fatos apurados não são suficientes para demonstrar o ato ilícitoimputado à reclamada e demais requisitos da responsabilidade civil.
Ainda, deve-se prestigiar a valoração realizada pelo juiz do casoe que teve contato direto com a prova oral, em face da proximidade que manteve com as testemunhas no momento de sua produção,o que lhe confere melhores condições de analisar a convicção e a sinceridade com que prestadas as informações.
Sendo assim, há falar em frustração das legítimas expectativas doreclamante, não havendo fundamento jurídico para condenação ao pagamento das indenizações pleiteadas pelo reclamante a títulode dano material e perda de uma chance.
Nego provimento ao recurso.
KARINA SARAIVA CUNHA
Relator
PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:
DESEMBARGADORA KARINA SARAIVA CUNHA (RELATORA)
DESEMBARGADORA BERENICE MESSIAS CORRÊA
DESEMBARGADOR CLÓVIS FERNANDO SCHUCH SANTOS