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Direito do Trabalho

Atualizado 19/08/2018

TRT4. NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DA OITIVA DE TESTEMUNHA.

Carlos Stoever

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TRT4. NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DA OITIVA DE TESTEMUNHA.
Identificação

PROCESSO nº 0020219-93.2017.5.04.0004 (RO)RECORRENTE: —–RECORRIDO: —–RELATOR: FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO

EMENTA

NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DA OITIVA DE TESTEMUNHA. Configura cerceamento de defesa o indeferimento de oitiva de testemunha quando se trata de matéria controversa nos autos, sobre a qual ainda se mostram necessários elementos probatórios para o adequado julgamento da lide. Recurso da reclamada a que se dá parcial provimento para determinar o retorno dos autos ao primeiro grau para a oitiva de testemunhas quanto ao horários de trabalho da reclamante.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso ordinário da reclamada para declarar a nulidade do feito a partir do indeferimento da produção de prova testemunhal, determinando-se o retorno dos autos à origem, para que seja realizada a oitiva de testemunhas, restando prejudicada a análise dos demais tópicos do recurso.

Intime-se.

Porto Alegre, 28 de junho de 2018 (quinta-feira).

Cabeçalho do acórdão
Acórdão
RELATÓRIO

Inconformada com a sentença (id 1974653), que julgou parcialmente procedente a ação, a reclamada recorre (id c94fbcf). Busca a concessão de efeito suspensivo ao recurso ordinário, argui cerceamento de defesa e requer a reforma da decisão quanto aos cálculos de liquidação, reversão da justa causa, horas extras, dano moral, insalubridade, cheque-rancho, honorários periciais e honorários advocatícios.

A reclamante apresenta contrarrazões (id be6b718).

Pelo contexto fático do processo (alegações e provas), verifica-se que a parte autora desempenhava as funções de operadora de telemarketing e que o período de trabalho deu-se de 14/01/2013 a 23/03/2015.

Sobem os autos a este Tribunal para julgamento, sendo distribuídos a este Relator.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

Processo com discussão de Direito Material anterior à Lei 13.467/2017, vigente a partir de 11/11/2017 e à Medida Provisória 808, publicada em 14/11/2017 (Reforma Trabalhista).

1. Efeito suspensivo.

A reclamada requer seja dado efeito suspensivo ao presente recurso ao argumento de que a expropriação de valores da reclamada, antes do trânsito em julgado da decisão, afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como ao seu direito ao devido processo legal. Invoca a aplicação dos arts. 495 e 1.029, § 5º do CPC e arts. 769 e 899, § 1º da CLT.

No processo do trabalho, os recursos interpostos, via de regra, são recebidos apenas no efeito devolutivo, permitida a execução provisória até a penhora (art. 899 da CLT). É possível a concessão de efeito suspensivo mediante ajuizamento de ação cautelar, nos termos da Súmula 414, item I, do TST:

Súmula nº 414 do TST

MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA (OU LIMINAR) CONCEDIDA ANTES OU NA SENTENÇA (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 50, 51, 58, 86 e 139 da SBDI-2) – Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005

I – A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. (ex-OJ nº 51 da SBDI-2 – inserida em 20.09.2000)

II – No caso da tutela antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença, cabe a impetração do mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. (ex-OJs nºs 50 e 58 da SBDI-2 – inseridas em 20.09.2000)

III – A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar). (ex-Ojs da SBDI-2 nºs 86 – inserida em 13.03.2002 – e 139 – DJ 04.05.2004)

Entende-se que é possível o requerimento de efeito suspensivo ao recurso ordinário, no entanto deve ser feito por meio de ação cautelar, como acima referido.

Nega-se provimento.

2. Cerceamento de defesa.

A reclamada recorre arguindo cerceamento de defesa. Refere que na audiência de instrução foi indeferida a oitiva de sua testemunha quanto à prova do horário de trabalho da reclamante. Destaca que foi ouvida apenas testemunha da reclamante e que o pedido de horas extras foi julgado procedente, motivo pelo qual “é flagrante o cerceamento de defesa e o prejuízo causado recorrente, por lhe ter sido retirada a oportunidade de fazer prova acerca da matéria fática alegada na inicial, frente à prova documental juntada e não considerada, o que culminou com a condenação imposta”. Salienta que lançou protesto antipreclusivo. Requer seja decretada a nulidade do feito a partir da audiência de instrução, com o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito, assegurada a oitiva de testemunhas.

Na audiência de instrução (id 50023440, foi ouvida a reclamante e após, assim restou consignado:

(…)

Considerando que a reclamada não traz aos autos os registros de horário, com exceção do mês da saída, admito como verdadeiros os horários informados pela reclamante, nos termos 400 do Código de Processo Civil.

A reclamada pretende fazer prova do horário com a testemunha Jéssica Rodrigues Medeiros, que indefiro em razão do que dispõe o art. 443 do CPC, que impede o juiz produzir prova oral sobre fato que deve ser provado por documento ou perícia. A reclamada protesta.

As partes não têm outras provas a produzir. Fica encerrada a instrução processual.

Razões finais orais remissivas, renovando a reclamada o protesto.

(…)

A sentença julgou procedentes os pedidos relativos às horas extras postulados na petição inicial, inclusive quanto aos intervalos intrajornada e art. 384 da CLT.

No sistema judiciário brasileiro, cabe ao juiz dirigir os trabalhos da audiência e ainda a inquirição das testemunhas (art. 820 da CLT). Ao juiz é dado o poder de determinar as provas necessárias à instrução do processo, podendo indeferir as diligências que considerar inúteis ou meramente protelatórias.

Para uma adequada prestação jurisdicional, a prova deve ser analisada em conjunto, embora possa ser constituída de diversos meios, conforme o princípio da unidade de prova. Provar algum fato no processo pode constituir ato complexo, para o qual concorrem diversos fatores. A construção de um elemento probatório é, em certa medida, criação de elemento de convicção a ser realizada pelas partes ou buscada pelo juiz. Qualquer meio de prova pode servir para reforçar a convicção gerada por outro meio de prova ou por uma presunção legal. Os valores não são construídos instantaneamente e sua elaboração depende de um processo cognitivo – associativo – valorativo.

Cumpre ressaltar que o Juiz é investido de poderes para apreciar livremente as provas do processo (art. 371 do NCPC). A teor do disposto no artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho, a prova das alegações incumbe à parte que as fizer. Portanto, ao autor compete a prova do fato constitutivo de seu direito e, ao réu, a prova dos fatos impeditivos, extintivos e modificativos do direito vindicado.

No caso, entre as pretensões da reclamante estão o pagamento de horas extras, intervalo intrajornada e intervalo do art. 384 da CLT.

A reclamada juntou parcialmente os registros de horário da reclamante (id 601b8ad). No entanto, pretendia produzir prova oral quanto à jornada de trabalho efetivamente cumprida pela reclamante.

Entende-se que, embora caiba à reclamada a prova de fatos impeditivos ao direito postulado pela reclamante, na forma do art. 373, inciso II do CPC, a não apresentação dos registros de horário pelo empregador gera presunção relativade veracidade do horário de trabalho indicado na petição inicial.

Nesse sentido, é a Súmula nº 338 do TST, in verbis:

I – É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não-apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário.

II – A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário.

III – Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir.” (sem grifos no original)

Tratando-se de presunção iuris tantum, pode ser afastada por prova em contrário, que, no caso, incumbia à reclamada.

Indeferida a prova testemunhal acerca do horário de trabalho da reclamante, restou obstaculizado o direito da reclamada de afastar ou mitigar a presunção relativa acolhida de forma absoluta pela Julgadora de primeiro grau. A reclamada poderia produzir prova a seu favor via oitiva de testemunhas, o que, entretanto, não lhe foi permitido, em cerceamento de seu direito de defesa.

Pondera-se que o juízo de primeiro grau, por mais respeitável que seja o seu posicionamento, nem sempre é definitivo. Os autos devem conter prova para livre convencimento, também, em eventual julgamento recursal. A parte tem sempre o direito – se impugnado aspecto fático pertinente à solução do litígio, como na presente hipótese – de produzir as demais provas cuja produção oportunamente requereu, sob pena de ofensa à garantia da ampla defesa inscrita no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal.

No mesmo sentido, destacam-se as seguintes decisões desta 8ª Turma:

NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PROVA ORAL. Configura cerceamento de defesa o indeferimento de prova oral quando se trata de matéria controversa nos autos, sobre a qual ainda se mostram necessários elementos probatórios para o adequado julgamento da lide. Recursos de ambas as partes aos quais se dá provimento para determinar o retorno dos autos ao primeiro grau para a produção da prova oral requerida pelos litigantes. (TRT da 4ª Região, 8a. Turma, 0066600-34.2009.5.04.0201 RO, em 22/08/2013, Desembargador Francisco Rossal de Araújo – Relator. Participaram do julgamento: Desembargador Juraci Galvão Júnior, Juíza Convocada Angela Rosi Almeida Chapper)

CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. Configura cerceamento de defesa o indeferimento de prova oral quando se trata de matéria controversa nos autos, sobre a qual ainda se mostram necessários elementos probatórios para o adequado julgamento da lide. Ainda que a prova oral não seja a via mais adequada para demonstrar a realidade técnica das situações tidas como insalubres, a divergência manifestada pela parte diz respeito às atividades desempenhadas pelo autor durante a contratualidade, divergência que pode ser dirimida por meio de testemunhas. Recurso da reclamada provido. (TRT da 4ª Região, 8a. Turma, 0000288-43.2012.5.04.0372 RO, em 22/05/2014, Desembargador Francisco Rossal de Araújo – Relator. Participaram do julgamento: Desembargador João Paulo Lucena, Desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal)

Pelo exposto, dá-se parcial provimento ao recurso ordinário da reclamada para declarar a nulidade do feito a partir do indeferimento da produção de prova testemunhal, determinando-se o retorno dos autos à origem, para que seja realizada a oitiva de testemunhas, restando prejudicada a análise dos demais tópicos do recurso.

Assinatura

FRANCISCO ROSSAL DE ARAUJO

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR FRANCISCO ROSSAL DE ARAÚJO (RELATOR)

DESEMBARGADOR LUIZ ALBERTO DE VARGAS

DESEMBARGADOR GILBERTO SOUZA DOS SANTOS

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Função Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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