Jurisprudência trabalhista

TRT4. RECURSO DO RECLAMANTE. RELAÇÃO DE EMPREGO.

Identificação

PROCESSOnº 0020773-69.2015.5.04.0013 (RO)
RECORRENTE: —–
RECORRIDO: —–
RELATOR: TANIA ROSA MACIEL DE OLIVEIRA

EMENTA

RECURSO DO RECLAMANTE. RELAÇÃO DE EMPREGO. Nãodemonstrados, à saciedade, os pressupostos fáticos e jurídicos da relação de emprego, em especial a subordinação, nos moldesdo disposto no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, inviável o reconhecimento do vínculo pretendido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 2ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento aorecurso ordinário do reclamante.

Intime-se.

Porto Alegre, 06 de julho de 2017 (quinta-feira).

Cabeçalho do acórdão

Acórdão

RELATÓRIO

Inconformado com a sentença de improcedência, recorre o autor.

Busca o reconhecimento de vínculo empregatício com a reclamada,com o retorno dos autos à origem para o julgamento dos pedidos decorrentes.

Após a juntada de contrarrazões, sobem os autos a este Tribunal.

Feito não sujeito à intervenção do Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

I- RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE

VÍNCULO EMPREGATÍCIO.

O autor postula o reconhecimentode vínculo empregatício com a reclamada no período de 02/01/2014 até 06/03/2015. Alegaque recebia o valor mensal de R$ 6.000,00 como diretor, valores estes que a recorrida alegou ser adiantamento por contade empresa que jamais teve lucro; que, conforme o contrato social da ótica RLS,sua constituição em 01/07/2014, deu-se quase 1 (um) anos após o início das atividades na Clínica Saúde, questionando a quetítulo tal valor era pago se a empresa RLS ainda nem existia, pelo que resta comprovado que a inclusão do autor na participaçãosocietária não teve lastro na ‘afectio societá’, impondo-se o reconhecimento da fraude maculada com a nulidade preconizadapelo art. 9º da CLT; que impugnou o contrato social da empresa RLS, refutando a tese apontada pela recorrida; que solicitoulicença de interesse particular do servidor estadual para dedicação exclusiva no desempenho junto a recorrida; que o sócio da reclamada, no depoimento pessoal, confirmou que o recorrente laborava na empresa; quenenhum recibo de pagamento ou contabilidade da empresa foi trazido aos autos, não sendo crível pagar 16 meses de salário aespera que a empresa dê lucro, chegando-se à conclusão de que o recorrente somente trabalhava para a recorrida (Clínica Visão),permanecendo subordinado com total exclusividade e dependência econômica, finalizando que o trabalho prestado pertencia aatividade finalística da empresa, e o recorrente era obrigado a cumprir horário e a seguir as determinações da Clínica Visão.

Analiso.

Combinadas as disposições dos artigos 2º e 3º da CLT, éempregado quem presta, pessoalmente, serviços não-eventuais, de forma subordinada, a quem, assumindo os riscos do empreendimento,fiscaliza e remunera a prestação destes serviços. A ausência de um dos elementos pode afastar de plano a possibilidade jurídicada caracterização do vínculo empregatício.

É o que se verifica no caso telado,porquanto a prova carreada aos autos não evidencia a presença de todos os elementos caracterizadores de vínculo de emprego,em especial, a subordinação jurídica do recorrente à reclamada, cabendo lembrar que a exclusividade não é requisito da relaçãode emprego.

Com efeito, a testemunha do autor, Flávio, foiouvida como informante, não se prestando o seu depoimento à prova pretendida,o qual, de qualquer sorte, restou infirmado pelos depoimentos das testemunhas da reclamada, esclarecedoresno sentido da inexistência de vínculo empregatício entre as partes. A testemunhaEdila afirma que “o autor nunca foi responsável por qualquer parte técnica ou administrativa de cirurgias; queo autor não tinha qualquer atividade ou dava ordens a funcionários na Clinica Visão (…) quem coordenava a Clinica Visãoe dava ordens aos funcionários era o sócio Luis Carlos Mello (…) que o autor nunca teve horário fixo para chegar e sairda clinica (…) que o autor nunca levou equipamentos cirúrgicos para os hospitais onde eram realizadas cirurgias pelos médicosda clinica”. A testemunha Nanci afirma que “o autor sempre foi gerenteda Ótica Melissa; que o autor não tinha um chefe; que era o próprio autor quem coordenava as atividades da Ótica Melissa (…)o autor nunca teve qualquer atividade relacionada a transporte, compra e organização de equipamentos para salas de cirurgiasnos hospitais feitas pelos médicos da Clinica Visão (…) a CTPS da depoente, quando foi contratada, foi assinada pelo sócioSanir da Ótica Melissa, ora autor; que até janeiro de 2015 era o autor quem dava ordens a todos os funcionários da Ótica Melissa;que até janeiro de 2015 a depoente não tinha contato com Renato Mello, outro sócio da Ótica Melissa” (ID. 585ddba).A afirmação da testemunha Edila de “ter participado de uma reuniãojuntamente com o autor no município de Novo Hamburgo, na Secretaria Municipal de Saúde, para regularizar o credenciamentoda Clinica Visão em relação às consultas oftalmológicas (…) a pedido de Renato Mello e na oportunidade a depoente e o autorrepresentaram a Clínica Visão (…) e foi a única vez que a depoente realizou qualquer atividade com o autor”,por si só, não enseja o reconhecimento de vínculo empregatício, ao contrário, tal informação somada ao teor da provaoral e os documentos juntados aos autos, reforça a tese defensiva acerca da condição de sócio do reclamante, nada mais sendoos R$ 6.000,00 do que “pro labore” e não o pagamento de salário. O examedo inteiro teor do depoimento do preposto não conforta a tese da inicial, ao contrário, o depoente Luiz Carlosde Mello é categórico ao afirmar que “o autor não era funcionário dareclamada; que o autor não mandava nada na reclamada; que quem mandava na reclamada era o próprio depoente; que o autor começousuas atividades já como sócio na RLS Óticas LTDA e por isso suas atividades sempre foram para a RLS Óticas LTDA e não paraa reclamada; que o autor era responsável pela RLS Óticas LTDA e não da reclamada; que o autor não poderia ser empregado dareclamada pois como a reclamada prestava serviços para o estado do Rio Grande do Sul, não poderia ter um funcionário que fosseservidor público do estado do reclamada sob pena de que a reclamada perdesse seu credenciamento de serviços de oftalmologiapara o SUS” (ID. 585ddba – Pág. 1). Não altera o decididoo fato de o autor ter impugnado o contrato social da RLS Ótica (na qual aparece como sócio juntamente com Renato Luis de Melloe Luiz Carlos de Mello, sendo detentor de 4.950 quotas do total de 15.000 quotas, ou seja, 1/3 do capital social – ID. bd66b9a),até porque não prova a afirmação de que a condição de sócio da Ótica foi imposta pelo sócio Luiz Mello (ID. 40b21a1).

No mais, a matéria foi examinada com proficiência pela MM. Julgadora do origem, cujosbem lançados fundamentos da sentença ora adoto como razões de decidir, “in verbis”:

1- DA RELAÇÃO HAVIDA ENTRE AS PARTES. RECONHECIMENTODO VÍNCULO. ANOTAÇÃO DA CTPS. PARCELAS RESCISÓRIAS. MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT

Alega o autor ter sidocontratado pela reclamada, para exercer a função de diretor superintendente, em 02/01/2014, com salário de R$ 6.000,00, até06/03/2015, quando foi despedido sem justa causa. Afirma que o contrato não foi anotado em sua CTPS, bem como nada recebeua título de parcelas rescisórias, o que postula.

A reclamada contesta,afirmando que o autor atuava na condição de sócio, já que, em razão do mesmo ocupar cargo público, como assistente de saúdedo estado do Rio Grande do Sul, não poderia ser gerente e nem participar da administração. Sustenta que o reclamante, porvolta de 2013, constituiu empresa no setor ótico, de nome RLS Ltda. (Óticas Melissa), juntamente com o sócio da reclamada,sr. Luiz Mello, tendo os mesmos, inclusive, locado imóvel para instalar a sede do estabelecimento. Diz ter ficado acordadoque, até que a empresa apresentasse efetiva lucratividade, o autor poderia retirar o valor mensal de R$ 6.000,00, a títulode antecipação de lucros. Assevera que, não tendo o referido empreendimento correspondido às expectativas do autor, este procurouseu sócio Luiz Mello, também sócio da reclamada, para propor-lhe parceria na empresa ré. Informa que, logo após, em comumacordo, o autor e o sócio da ré acharam por bem não mais dar continuidade ao processo de alteração contratual da ré, paraa inclusão do reclamante, bem como resolveram dissolver a sociedade na empresa RLS Ltda. (Óticas Melissa). Alega que, faceà condição de sócio do autor, não há vínculo de emprego a ser reconhecido, sendo improcedentes, ainda, as demais parcelaspostuladas. Requer a improcedência dos pedidos.

Vejamos:

Na forma preconizada noart. 3º da CLT, para que seja reconhecida como de emprego uma relação jurídica, necessário se faz que haja prestação de serviçode uma pessoa física a outra, física ou jurídica, de forma não eventual, subordinada e mediante remuneração.

Assim, para a relaçãoconfigurar-se como de emprego há de ser intuito personae; de caráter não eventual, sem que se questione inclusive se realizadode forma contínua ou não; com subordinação, que se traduz pelo poder diretivo do empregador, e mediante contraprestação.

Admitida a prestação,mas negada a relação jurídica de emprego, como ocorre no caso dos autos, inverte-se o ônus probandi, que passa a ser do empregador,a teor dos artigos 818 da CLT e 373, II, do NCPC.

No caso em exame, a rédesincumbiu-se a contento do ônus que lhe pertencia.

Ressalte-se que a reclamada trouxe aos autos o contrato social da reclamada RLS Ltda.(Óticas Melissa), comprovando a participação do reclamante na condição de sócio (ID bd66b9a), bem como junta o contrato delocação de imóvel para instalação da referida empresa (ID fb6332f), documentos estes não impugnados pelo autor.

No entanto, é a prova testemunhal que afasta de vez a controvérsia dos autos, fulminando a pretensão do reclamante.

Em seu depoimento, a testemunhaEdila da Silveira, convidada pela reclamada, afirma que “conhece o autor por ter visto o autor na Clínica Visão ora reclamada;que lembra que o autor usava uma sala dentro da Clínica Visão, em média umas 4 vezespor semana, por um ou dois turnos; que isso foi autorizado por Renato Mello, que é filho do sócio da reclamada, Luiz CarlosMello; que isso ocorreu entre fevereiro de 2014 e janeiro de 2015; que a depoente era auxiliar administrativo da ClínicaVisão; que o autor, enquanto usou a referida sala nas dependências da Clínica Visão,sempre tratou assuntos da Ótica Melissa; que a Ótica Melissa ficava ao lado da Clínica Visão; que o autor era sócio da ÓticaMelissa; (…) que o autor não tinha qualquer atividade ou dava ordens a funcionários na Clínica Visão; (…) que quemcoordenava a Clínica Visão e dava ordens aos funcionários era o sócio Luiz Carlos Mello” . (grifos nossos)

A seu turno, a testemunhaNanci Gomes, ouvida a convite da ré, declara que “trabalha na Ótica Melissa desde 24/07/2014, como vendedora; que os sóciosda ótica Melissa são Luiz Carlos Mello, Renato Mello e Sanir Acosta, ora autor; que o autor sempre foi gerente da Ótica Melissa;que o autor não tinha um chefe; que era o próprio autor quem coordenava as atividades da Ótica Melissa; que o autor foi gerenteda Ótica Melissa já desde julho de 2014, quando a depoente entrou, até janeiro de 2015; que não sabe quando exatamente o autorcomeçou a ser gerente na ótica melissa; que ao que lembra a depoente, o autor nunca teve qualquer atividade relacionada atransporte, compra e organização de equipamentos para salas de cirurgias nos hospitais feitas pelos médicos da Clínica Visão;que a Clínica Visão fica ao lado da Ótica Melissa, ambas em Novo Hamburgo;que a Ótica Melissa funciona até hoje, onde trabalha a depoente; que atualmente a Ótica Melissa tem dois funcionários, alémdo sócio Renato; que o sócio Sanir, ora autor, não tem mais comparecido na Ótica Melissa desde janeiro de 2015; que a CTPSda depoente, quando foi contratada, foi assinada pelo sócio Sanir da Ótica Melissa, ora autor; que até janeiro de 2015 erao autor quem dava ordens a todos os funcionários da Ótica Melissa; que até janeiro de 2015 a depoente não tinha contato comRenato Mello, outro sócio da Ótica Melissa”.

Frise-se que o depoimentoda única testemunha convidada pelo autor nada acrescentou ao deslinde do feito, uma vez que, além de ser ouvida na condiçãode informante, declara que “eu só sei das minhas atividades no meu consultório, na minha sala de cirurgia”.

O conjunto probatóriodos autos é por demais claro no sentido de que o reclamante somente atuou na empresa RLS Ltda. (Óticas Melissa), da qual erasócio. A esporádica utilização pelo autor de sala localizada dentro das dependências da ré, por si só, não implica que o mesmorealizasse atividades ligadas à reclamada, já que tratam-se de empresas com sócios em comum em sua composição, além de estaremsituadas, geograficamente, lado a lado.

Assim, evidenciada a condiçãodo reclamante, de sócio de empresa estranha ao feito, bem como não tendo sido demonstrada qualquer prestação de serviços àré, não há falar-se em reconhecimento de vínculo de emprego entre as partes, indeferindo-se, por consequência, os pedidosdaí decorrentes”

(ID. a5f1fff).

Do exposto, nada há a reformar no julgado de origem, mantendo-sea decisão que não reconheceu a existência de relação empregatícia e indeferiu os pedidos consectários.

Nego provimento, rejeitando todos os argumentos recursais.

II – PREQUESTIONAMENTO

A presente decisão não afronta as normas suscitadas, constitucionaisou não, súmulas e orientações jurisprudenciais, ainda que não tenham sido expressamente mencionadas no acórdão, havendo apenasdivergência de orientação e entendimento quanto à aplicabilidade. Cite-se, ainda, a respeito, as OJs 118 e 119, ambas da SDI-1do TST, tendo-se os dispositivos invocados como prequestionados, o que considero igualmente em relação às teses lançadas.

7242.

Assinatura

TANIA ROSA MACIEL DE OLIVEIRA

Relator

VOTOS

JUIZ CONVOCADO CARLOS HENRIQUE SELBACH:

Acompanho o voto da Exma. Desembargadora Relatora.

DESEMBARGADOR MARCELO JOSÉ FERLIND AMBROSO:

Acompanho o voto da Exma. Desa. Relatora, em consonância de seusfundamentos.

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADORA TÂNIA ROSA MACIEL DE OLIVEIRA (RELATORA)

JUIZ CONVOCADO CARLOS HENRIQUE SELBACH

DESEMBARGADOR MARCELO JOSÉ FERLIN D AMBROSO

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